quinta-feira

Silêncio

Vivem presos socos, secos e camas,
Amarrados pulsos, braços e punhos em chamas,
Soltam se os gritos, músculos e certos tendões,
Fogem os dedos presos por leves cordões,

Agarrados os cabelos, os selos e os dois botões,
Guardados os medos, os segredos e as três questões,
Libertam se as segundas, a quinta e a primeira,
Escapa lhe a terça e há sexta a bebedeira,

Acordam ao Domingo onde o Sábado não existe,
Riscam os discos e o vinil que persiste,
Voltam os presos socos, secos e camas,
É com o silêncio que me dizes quem amas.

terça-feira

Irrigação sanguinea

Fogo infernal que sempre me devora,
Dilatam se os poros pelo tempo que demora,
Ladrão de cofre interno escondido,
Pulsação alterada num músculo remexido,

Verdade Inédita que começa como filha,
Vagabundo condenado atirado a uma ilha,
Finge aprender num acto de esperança,
Enrugada a pele com coração de criança,

Se na cidade não sabe onde mora,
Faz dessa ilha a sua nova glória,
Despojado de roupas e do que roubou,
Lança se eterno à solidão que o matou,

Atiradas as culpas a uma alma inocente,
Torna se animal em corpo demente,
Não é por amar assim que chora,
É o seu coração a 100km hora.

quarta-feira

Não te vi.

Coberto de pó nos poros,
Depois o calor do teu cheiro,
Memória de tempos inglórios,
Alegria de quem chega primeiro.
O milagre da presença sofrida,
Num acto de prece descontente,
Na tua face escondida,
O compasso de música ausente.
No fim do mundo ainda existe,
A única roda dos ventos,
Longe de tudo o que persiste,
Perto da fonte dos lamentos.
Perco me em lágrimas e prantos,
De um pobre cansado de andar,
Enrolo me em pequenos mantos,
Para que não te veja a passar.

segunda-feira

Itá-Syra

Que estrada é essa por onde vagueias,
Em que muito dormes e pouco planeias,
Ladeada de frutos de nevoeiro,
E infindáveis campos de centeio?

Que ausência é essa que se sente,
Num silêncio breve e demente,
De quem namora o impossível,
Senhora'Dor previsível?

O nada é muito a sobrepor,
De tudo um pouco sofre o amor,
Só o estúpido se aguenta,
(Porque hoje...) até a pedra se lamenta.

quarta-feira

36 segundos

Eterna dança da dura terra,
Em que todos dormem, ninguém espera,
Pilares de areia que não sustentam,
Braços frágeis que não aguentam.

Outrora vida a duas cores,
Verde e azul de pequenas flores,
Cabe-lhes agora a inglória e a amargura,
De enterrar os mortos na própria sepultura.

E se eram tantos há apenas 1 hora,
Em 30 segundos já não se sabe onde mora,
Perguntas se ficas ou se estás bem aqui,
Continuas no mapa, meu pequeno Haiti.

quinta-feira

53º

Hoje não há nada para perceber.
Sabem das coisas, todas, como se fosse a última.
Sobem litradas de bancadas, de flores na mão, como se fossem ao encontro de uma qualquer alma. Lado esquerdo, lado direito, mil cabeças, ping-pong.
Nem te olha, não te vê, e tu suas enquanto sobes.
Depois vêm velhas medidas, não há cá o quilograma.
Pesam te as pernas e mais suas, mais sobes, menos te vê.
Corres como carteiro.
Esse chega só ás 2.
E suas.
Sobes.
Desapareces.

Não

E assim te deitas sobre os cotovelos,
Braços marcados pelos sonhos sem vê-los,
Pequeno seio o teu que a amamentou,
Mulher fugaz que a vida fadou.

Às nações hoje que deixam mistérios,
Desdobram-se em tudo e perdem impérios,
Exuberância fina num andar de costas,
Queda de flores vivas em árvores dispostas.

Meta alcançada onde gritam os mortos,
Aplaudem o amor e os barcos em portos,
Obsessão vadia onde jaz a ternura,
Riscas o tempo e comes pedra dura.

E assim descansas onde um dia foi partida,
Mensagens de imagens passadas de fugida,
Encontras na criancice o mais que te dão,
Deitas te nas escadas que hoje te dizem não.

olhos em terra de cegos

talvezse tu soubessesqueomundoacabariaamanhã
provavelmentecorreriasemlinha recta atéchegaresamim
atinãotefaltaoarmassimaspalavras
porissofoge.

Acerca de mim

Gosto do sentido agri-doce

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